Em 2002, a LPN iniciou o Projecto LIFE-Natureza "Recuperação do Peneireiro-das-torres em Portugal". Com a duração de quatro anos, este projecto teve como principal objectivo a recuperação em Portugal desta espécie globalmente ameaçada, através da preservação e incremento dos seus locais de alimentação e de nidificação.
O Projecto Peneireiro-das-torres envolveu um grande número de especialistas, técnicos, agricultores e proprietários que, em conjunto com a LPN, desenvolveram várias medidas para inverter a tendência de decréscimo populacional desta espécie - monitorização, investigação científica, medidas de gestão dos locais de nidificação e alimentação, sensibilização e educação ambiental.
Um dos principais resultados do Projecto Peneireiro-das-torres foi o aumento do efectivo populacional desta espécie em Portugal. Em 2001, o ano em que foi realizado o primeiro censo nacional, a população estava estimada em cerca de 272 casais. Registou-se um aumento de 54% até 2006, ano em que foram estimados 445 casais a nidificar em 55 colónias, distribuídas sobretudo no Baixo Alentejo.
Considerada, no passado, uma das aves mais comuns da Europa, na segunda metade do séc. XX esta espécie viu aos seus indivíduos diminuírem em cerca de 90% em toda a sua área de distribuição, tendo-se mesmo verificado a extinção de algumas populações em vários países, como a Áustria ou a Hungria.
Actualmente, estima-se que na Europa existam entre 25.000 a 42.000 casais reprodutores. Este acentuado declínio, também se verificou em Portugal, tendo levado nas últimas décadas ao desaparecimento de inúmeros núcleos reprodutores (Portalegre, Elvas, Vila Viçosa, Évora, Beja, Marvão, Barrancos, Castro Marim, Costa Sudoeste, Costa a Norte de Lisboa). Dos 700 casais estimados nos anos 40 do século passado, em 1996 existiam apenas cerca de 150 casais, restringidos quase exclusivamente à área do Baixo Alentejo.
Sendo uma das espécies de aves de presa que tem sofrido uma maior redução na sua população a nível mundial, o Peneireiro-das-torres está hoje classificado como Espécie Globalmente Ameaçada (pela BirdLife Internacional), tendo o estatuto de Vulnerável na Europa (pelo IUCN).
Face à vulnerabilidade actual desta espécie e com base em diversos trabalhos realizados, que possibilitaram a identificação das causas do seu declínio populacional no país, a LPN iniciou em 2002 o "Projecto Recuperação do Peneireiro-das-torres em Portugal", com o intuito de inverter esta tendência.
Quais as causas do decréscimo do Peneireiro-das-torres?
O Peneireiro-das-torres nidificava nos edifícios e monumentos antigos, alimentando-se nas extensas áreas agrícolas de cereal de sequeiro e pastagens em redor das vilas e cidades. A recuperação do património histórico e o restauro dos edifícios levaram ao desaparecimento de muitos locais de nidificação desta espécie. Por outro lado, as alterações das práticas agrícolas (diminuição das áreas de rotação de cereal e pousio, aumento dos cultivos com regadio, abandono da agricultura, florestação e intensificação da pastorícia) provocaram uma diminuição preocupante do seu habitat de alimentação.
O Projeto Peneireiro-das-torres integrou um conjunto de intervenções centradas no aumento dos locais de nidificação e melhoria das áreas de alimentação, na diminuição da predação e competição interespecífica e na sensibilização do público, nas principais áreas de ocorrência da espécie em Portugal.
Entre as principais ações contam-se:
As áreas de intervenção do Projecto Peneireiro-das-torres foram as Zonas de Protecção Especial (ZPE) de Castro Verde, Vale do Guadiana e Campo Maior. Na ZPE de Castro Verde está concentrada cerca de 70% da população nacional deste falcão, devido, não só às acções de melhoramento dos habitats de nidificação, mas também à existência de uma Medida Agro-Ambiental, o Plano Zonal de Castro Verde, que tem permitido garantir a preservação dos habitats pseudo-estepários, fundamentais para o Peneireiro-das-torres.
A ZPE do Vale do Guadiana alberga a única colónia urbana actualmente existente no nosso país. Nos anos 90, a maior colónia de Peneireiro-das-torres concentrava-se na vila de Mértola, nidificando nos monumentos e nas muralhas do castelo.
Como a única colónia que existia na ZPE de Campo Maior desapareceu, esta área já só é utilizada como zona de alimentação das colónias espanholas, localizadas junto à fronteira.
O Projecto Peneireiro-das-torres garantiu, ainda, o acompanhamento da situação populacional desta espécie migradora em toda a sua área de distribuição, nomeadamente nas colónias de Évora, Cuba e Vila Fernando.
O principal resultado deste Projecto reflecte-se no aumento do número de casais de Peneireiro-das-torres. Em 2001, o ano que marcou o primeiro censo nacional desta espécie, o efectivo populacional foi estimado em menos de 300 casais. Em 2006 contabilizaram-se 445 casais de Peneireiro-das-torres, que nidificaram em mais de 50 colónias. Este resultado representa um aumento de 54% em apenas cinco anos.
Como se explica este aumento do Peneireiro-das-torres?
O aumento do efectivo populacional desta ave ameaçada deve-se, sobretudo à situação na ZPE de Castro Verde, que cresceu cerca de 60% desde 2001. A maioria das acções de melhoramento do habitat de nidificação ocorreu em colónias localizadas nesta ZPE. Além disso, foi possível garantir a manutenção dos sistemas agrícolas extensivos de sequeiro nesta região, através do Plano Zonal de Castro Verde (uma Medida Agro-ambiental que está em vigor desde 1995). Estes dois factores contribuíram decisivamento para o crescimento da população portuguesa de Peneireiro-das-torres.
Gestão dos habitats de nidificação
Desde o início do Projecto, e antes do começo de cada época de nidificação, procedeu-se ao melhoramento dos locais de nidificação em várias colónias, através da consolidação de paredes e sua impermeabilização, assim como à abertura de melhoria de cavidades. Nas áreas com boa disponibilidade de habitat de alimentação, foram construídas novas estruturas. No total, 7 Paredes de Nidificação disponibilizaram 424 novas cavidades para o Peneireiro-das-torres, nas ZPE's de Castro Verde e do Vale do Guadiana.
Além dos melhoramentos em cavidades, foram disponibilizados dois modelos de estruturas artificiais de nidificação: caixas-ninho e potes-ninhos, colocados em edifícios que não possuíam cavidades naturais para a nidificação. O pote-ninho surgiu da necessidade de se adaptar a presença da espécie aos edifícios que vão sendo remodelados e alguns deles transformados em barracões agrícolas. Estes "potes" em barro foram concebidos com base em modelos utilizados em Espanha, constituindo uma opção mais duradoura que as caixas-ninho, dado que a madeira se deteriora com maior facilidade.
Durante os quatro anos do Projecto foram disponibilizados 812 novos locais de nidificação, 615 cavidades, 115 caixas-ninho e 82 potes-ninho. Cerca de 30% da população nacional de Peneireiro-das-torres nidificou nestes novos locais.
Selecção do habitat e gestão das áreas de alimentação
Estudos de selecção de habitat
Os estudos desenvolvidos numa das maiores colónias de Peneireiro-das-torres do país, localizada na ZPE de Castro Verde, permitiram identificar os habitats preferenciais para o Peneireiro-das-torres se alimentar. Para obter estas informações, recorreu-se à telemetria, uma técnica que permite identificar os locais onde as aves estão a caçar. Foram colocadas três antenas com cerca de oito metros de altura em pontos elevados em redor da colónia, de forma a detectar os sinais emitidos pelos 30 Peneireiros-das-torres portadores de rádio-transmissores. Observou-se que esta espécie prefere caçar em zonas de pousio pastoreado e restolho, evitando as florestas e o pousio não pastoreado.
Uma presa muito importante para o Peneireiro-das-torres, especialmente durante as fases de alimentação, de corte e postura dos ovos, é o Ralo (Gryllotalpa sp.). Este Ortóptero encontra-se associado a zonas húmidas, onde escava galerias no solo com as suas patas dianteiras adaptadas para o efeito. Efectuaram-se transectos de automóvel para detecção auditiva de ralos, tendo-se verificado que estes seleccionam linhas de água não lavradas, com grande percentagem de pousios pastoreados nas imediações e baixa percentagem de pousios não pastoreados.
Normas de gestão
Estas informações sobre a selecção de habitat do Peneireiro-das-torres foram muito importantes para a definição de normas de gestão agrícola, que deverão ser incorporadas em Medidas Agro-Ambientais a implementar nas zonas que rodeiam as colónias de Peneireiro-das-torres. As normas de gestão que contribuem para a conservação do habitat de alimentação deste falcão são:
Da teoria à práctica
Efectuaram-se contratos com agricultores no sentido de inverter a tendência de abandono agrícola que se verifica actualmente em alguns locais e maximizar a disponibilidade de presas para o Peneireiro-das-torres. No total, foram intervencionados 199 ha (para além dos 1.700 ha das herdades da LPN) nas imediações de colónias através da sementeira de cereal (trigo mole, triticale e cevada branca) e da aplicação das normas de gestão agrícola referidas anteriormente.
Monitorização, vigilância e recolha de crias debilitadas
Durante quatro anos, a população de Peneireiro-das-torres foi monitorizada desde a chegada das aves em Fevereiro até ao final de Julho, quando iniciam a migração para África.
As colónias foram visitadas regularmente, de forma a acompanhar o sucesso reprodutor dos casais e identificar os principais factores de ameaça. Os juvenis nascidos em cada ano foram, ainda, marcados com anilhas metálicas e coloridas para acompanhar a evolução da população.
Durante a monitorização e vigilância, foram detectados juvenis debilitados ou feridos, que caíram dos ninhos. Estas aves foram encaminhadas para o Centro de Acolhimento e Recuperação de Animais Silvestres (CARAS) da LPN, em Évora. A recolha e recuperação de crias debilitadas permitiram a libertação de 107 juvenis, o que correspondeu a quase 4% das crias anilhadas e representou um importante contributo para reduzir a mortalidade juvenil.
Sensibilização e Educação Ambiental
Ao longo do Projecto LIFE foram desenvolvidas várias actividades, dirigidas a públicos de todas as idades, e produzidos diversos materiais audiovisuais, com o objectivo de «apresentar» o Peneireiro-das-torres e as suas ameaças às pessoas, motivando-as a participar activamente na sua conservação.
Foram desenvolvidos projectos de Educação Ambiental, extracurriculares, dedicados à conservação do Peneireiro-das-torres, por grupos de escuteiros e por alunos dos diferentes graus de ensino, em particular da região de Castro Verde. Algumas das actividades desenvolvidas nestes projectos incluíram a construção de móbil de peneireiro em madeira, pintura de potes de nidificação e construção e colocação de caixas-ninho, análise de regurgitações recolhidas em colónias, sessões de anilhagem e telemetria, entre outras.
Realizaram-se Cursos de Formação sobre Conservação da Avifauna Estepária e Recuperação de Espécies Ameaçadas, principalmente dirigidos a professores. Nestes pretendeu-se sensibilizar os formandos para a importância das estepes cerealíferas e conservação da avifauna associada a este ecossistema, bem como para o desenvolvimento e dinamização de Projectos de Educação Ambiental.
Efectuaram-se acções de sensibilização em todas as épocas de nidificação, como o Dia de Boas Vindas ao Peneireiro-das-torres e o Dia do Peneireiro-das-torres, onde se desenvolveram várias actividades, como caminhadas ambientais, peddy-papers e construção de caixas-ninho.
O Congresso Internacional Ecossistemas Agrícolas e Riqueza Biológica: principais ameaças e medidas de conservação e o Workshop Internacional de Conservação do Peneireiro-das-torres realizaram-se em 2004, para promover a sensibilização do público e o intercâmbio de experiências e de acções de conservação.
Materiais audiovisuais
Manuais Escolares com revisão científica da LPN
Numa colaboração que constitui um exemplo a seguir, a LPN procedeu à revisão científica do manual da disciplina de Ciências Naturais, para o 8º ano, "Sistema Terra - Sustentabilidade na Terra", editado pela Texto Editores. Um DVD Vídeo sobre a recuperação do Peneireiro-das-torres (Falco naumanni), produzido pela LPN será distribuído gratuitamente a todos os professores que utilizem este manual, bem como a todos os delegados responsáveis pela disciplina, nas escolas em que é leccionada. Este novo manual constitui-se portanto como um excelente exemplo de colaboração entre uma editora, com extensa e comprovada experiência na elaboração de manuais escolares em Portugal, e a mais antiga Organização Não Governamental de Ambiente da Península Ibérica, com vasto currículo em termos de intervenção e educação ambiental.
No DVD, que se destina a todos os professores e educadores que desejam conhecer e participar na conservação do habitat pseudo-estepário e biodiversidade associada, estarão disponíveis, para além de um vídeo que demonstra as acções de conservação realizadas no contexto do projecto referido, um Caderno do Professor com Guia de Apoio à Conservação do Penereiro-das-torres, um Caderno Pedagógico e fichas de exercícios para os três ciclos do Ensino Básico e Ensino Secundário.
No âmbito das várias acções do Projecto Peneireiro-das-torres, foi produzido um conjunto de relatórios que estão disponíveis para consulta. No entanto, alguns contêm informação que poderá criar vulnerabilidade acrescida a uma espécie tão sensível como o Peneireiro-das-torres. Deste modo, apenas alguma documentação está disponível online.
Se desejar consultar algum relatório que não consta neste portal, por favor contacte a LPN.
Nome comum
Peneireiro-das-torres, Peneireiro-de-dorso-liso ou Francelho. Noutras línguas é chamado de Cernícalo primilla (espanhol), Lesser kestrel (inglês), Faucon crécerellette (francês) ou Rötelfalke (alemão).
Sistemática
Classe Aves, Ordem Falconiforme, Família Falconidae
Morfologia
Ave de presa com 29-32 cm de comprimentos e 58-72 cm de envergadura. O peso raramente ultrapassa os 200gr.
Distribuição
Nidifica na região Mediterrânica e interior do continente Euroasiático, e inverna na África sub-sahariana. Na migração pode efectuar voos sem paragens durante 2400 km.
Habitat
Áreas com predominância de cultivo extensivo de cereal de sequeiro, em regime de rotação com pousios.
Alimentação
Essencialmente insectos (gafanhotos, grilos-ralos e escaravelhos), mas também pequenos répteis (lagartixas) e pequenos mamíferos, como ratos do campo.
Comportamento
Ave colonial, mas que pode nidificar isoladamente, chegando a formar colónias que podem ultrapassar a centena de casais. Em Portugal nidifica quase exclusivamente em paredes e telhados de edifícios abandonados, apoveitando as cavidades que surgem naturalmente. Caça geralmente em grupo, peneirando à procura de alimento, que pode ser ingerido no ar. Durante o período de cortejamento (antes e durante a postura) os machos alimentam as fêmeas.
Nidificação
Em Abril-Maio iniciam as posturas (3-5 ovos). A incubação prolonga-se por 28 dias e é feita por ambos os progenitores. Em Maio-Junho nascem as crias que permanecem no ninho cerca de um mês, alimentadas pelos progenitores. Entre Junho e Julho as crias com 35 dias de idade abandonam o ninho.
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