Arçã, Alfavaca, Azedinha e Almeirão: estes são os nomes atribuídos aos quatro abutres-pretos (Aegypius monachus), três fêmeas e um macho, que estiveram na jaula de aclimatação construída no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return no Parque Natural do Douro Internacional. A jaula foi aberta no domingo, 3 de novembro, e, depois de terem adiado um pouco o regresso à liberdade, já começam a fazer, na manhã desta segunda-feira, 4 de novembro, as primeiras incursões fora da estrutura.
Os quatro abutres-pretos que estiveram em aclimatação no Douro Internacional e os respetivos nomes. ©Palombar
Nomes celebram património natural
Os nomes dos abutres foram escolhidos por alunos e alunas do 7.º ano do Agrupamento de Escolas Guerra Junqueiro, de Freixo de Espada à Cinta, durante ações de sensibilização e educação ambiental sobre o projeto desenvolvidas em meio escolar pela equipa do Departamento de Educação Ambiental e biólogos da Palombar - Conservação da Natureza e do Património Rural.
Por terem sido os primeiros abutres a integrar este programa de soft release, todos receberam nomes iniciados pela letra A. Os nomes são também alusivos ao património natural e cultural da região:
Arçã: é o nome dado, em Trás-os-Montes, a uma espécie de rosmaninho;
Alfavaca: é uma planta aromática. Os alunos escolheram este nome porque, segundo explicaram, "esta planta é utilizada para tratar infeções e feridas. E, tal como a planta cuida de nós, o abutre-preto também cuida de todos, porque faz parte da patrulha de limpeza da natureza";
Azedinha: nome que alude ao estômago dos abutres, que é muito ácido ou “azedo”;
Almeirão: é uma planta herbácea nativa do sul da Europa, que quiseram homenagear.
Ações de educação e sensibilização ambiental dinamizadas pela Palombar no Agrupamento de Escolas Guerra Junqueiro, de Freixo de Espada à Cinta. ©Palombar
Abutres foram resgatados e reabilitados em centros de recuperação para a fauna
Estes quatro abutres-pretos inauguraram a jaula de aclimatação construída no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return em Fornos, no concelho de Freixo de Espada à Cinta, numa propriedade dos parceiros de projeto ATN/Faia Brava.
Todos estes abutres são juvenis, nascidos em liberdade (dois em 2022 e dois em 2023), que tinham sido encontrados debilitados em vários pontos do país. Foram resgatados e reabilitados em diversos centros de recuperação: CARAS - Centro de Acolhimento e Recuperação de Animais Silvestres (Évora), dois deles; outro no CERAS - Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens (Castelo Branco) e mais um no CRASM - Centro de Recuperação de Animais Selvagens de Montejunto (Tojeira, Cadaval).
Posteriormente, todos foram transferidos para o CERAS, onde terminaram a sua reabilitação, e daí para a jaula, que foi inaugurada a 21 de maio de 2024. A introdução dos abutres na jaula foi acompanhada por equipas de veterinários do CERAS e do Centro de Recuperação de Animais Selvagens do Hospital Veterinário da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (CRAS/HV-UTAD), que também apoiaram durante a recolha de amostras biológicas e a colocação de emissores GPS/GSM.
Os quatro abutres-pretos na jaula de aclimatação construída em Fornos - Douro Internacional ©Palombar
Aclimatizar para fidelizar
A jaula de aclimatação foi construída com o objetivo de receber abutres-pretos provenientes de centros de recuperação para a fauna, para que se possam adaptar ao ambiente natural de forma gradual e fidelizar-se à região. O objetivo é de reforçar a colónia reprodutiva transfronteiriça do Douro Internacional, que é bastante frágil pelo seu reduzido tamanho e por ser a mais isolada das colónias portuguesas. Através deste programa de soft release, o projeto LIFE Aegypius Return prevê devolver à natureza 20 abutres-pretos até 2027, nesta área protegida.
Os quatro abutres-pretos em aclimatação a observar um evento de alimentação com várias aves necrófagas, em frente à jaula.
O tímido regresso à liberdade: o incentivo do abutre-preto Arribes e as peripécias com um grifo curioso
No domingo, 3 de novembro de 2024, o regresso dos quatro abutres-pretos à liberdade foi celebrado com um evento aberto ao público, organizado pela Palombar. O evento incluiu uma caminhada e vários momentos de sensibilização ambiental, e contou com cerca de 30 participantes. A abertura da jaula foi observada a grande distância pela maioria dos presentes, a partir do Miradouro do Carrascalinho, respeitando a necessária tranquilidade das aves. Apenas um grupo muito reduzido de pessoas se deslocou até ao local onde está instalada a estrutura.
Seguindo os procedimentos estabelecidos para o soft release, a libertação das aves é feita com o mínimo contacto com seres humanos, para não perturbar as aves. A jaula foi aberta pelo criador de gado e pastor Nélson Cordeiro, em representação deste setor de atividade fundamental para a conservação do abutre-preto, em conjunto com António Pinto, da União das Freguesias de Lagoaça e Fornos, que tem colaborado de forma ativa na sensibilização da comunidade local para a importância dos abutres e dos seus serviços de ecossistema.
Esquerda: Nélson Cordeiro, pastor e criador de gado a abrir a jaula de aclimatação. Direita: Participantes a observar a abertura da jaula de aclimatação, à distância.
Depois da jaula aberta, os abutres decidem quando querem sair, sem intervenção dos técnicos do projeto. A espera pela saída acabou por ser bastante prolongada! Os quatro abutres decidiram permanecer mais uma noite na jaula, já aberta, e só saíram no dia seguinte, esta segunda-feira, 4 de novembro, pelas 11h21. Aparentemente, precisaram do incentivo do Arribes, um outro abutre-preto juvenil, selvagem, que nasceu este ano na colónia do Douro Internacional e que recebeu um emissor GPS/GSM. O Arribes acabou por entrar na jaula e “chamar” os seus pares, que o seguiram para o exterior muito timidamente. Do exterior, toda a cena era observada por um grifo (Gyps fulvus) curioso, que se foi aproximando e que gerou animosidade entre os cinco abutres-pretos. O Arribes acabou por se afastar, voando, e os quatro abutres, no limiar da porta, deixaram o grifo entrar na jaula e alimentar-se dos restos de carne que ainda lá havia. A pouco e pouco, os quatro abutres foram explorando o ambiente exterior e já passaram a primeira noite em liberdade.
Os quatro abutres-pretos na jaula de aclimatação já aberta, e Arribes, um abutre-preto juvenil selvagem, no exterior.
Cinco abutres-pretos: os quatro da aclimatação e o jovem Arribes, que entrou momentaneamente na jaula.
Os quatro abutres-pretos da aclimatação no exterior da jaula e um grifo no interior.
Movimentos do abutre-preto Alfavaca, no primeiro dia de regresso à liberdade.
Os parceiros LIFE Aegypius Return agradecem a todas as pessoas e entidades envolvidas nos procedimentos da aclimatação: médicos-veterinários e centros de recuperação, Guarda Nacional Republicana (GNR) e Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente da GNR – SEPNA, Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e Vigilantes da Natureza, criadores de gado, técnicos, Junta da União das Freguesias de Lagoaça e Fornos, a comunidade do Agrupamento de Escolas Guerra Junqueiro, e cidadãos individuais que têm participado e apoiado as ações do projeto LIFE Aegypius Return.
Sobre o projeto LIFE Aegypius Return
O projeto LIFE Aegypius Return é cofinanciado pelo programa LIFE da União Europeia. O seu sucesso depende do envolvimento de todos os stakeholders relevantes, e da colaboração dos parceiros, a Vulture Conservation Foundation (VCF), beneficiário coordenador, e os parceiros locais Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural, Herdade da Contenda, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Liga para a Protecção da Natureza, Associação Transumância e Natureza, Fundación Naturaleza y Hombre, Guarda Nacional Republicana e Associação Nacional de Proprietários Rurais e Associação Nacional de Proprietários Rurais Gestão Cinegética e Biodiversidade.
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