Consulta Pública sobre o Relatório do Grupo de Trabalho do Lítio

Contributo da LPN para a Consulta Pública sobre o Relatório do Grupo de Trabalho do Lítio

 

 

O Grupo de Trabalho do Lítio, criado com o objetivo de identificar e caracterizar as ocorrências dos depósitos minerais de lítio apresenta, no seu relatório final, a identificação e caracterização dos depósitos existentes no território nacional, bem como das formas que permitem a sua utilização. O documento resume ainda o quadro legal e regulamentar da exploração de depósitos minerais, propõe uma análise SWOT e termina com recomendações e propostas sobre a exploração destes depósitos minerais.

 

Os Capítulo IV e V apresentam uma bem estruturada e importante identificação e caracterização dos depósitos minerais de lítio no território nacional. No entanto, de entre as 11 áreas identificadas, 7 abrangem áreas classificadas (de grande valor ecológico nacional e comunitário) - 6 são áreas de Rede Natura 2000 e uma é área protegida (Parque Natural) - ver Quadro 5.7 do cap. V. Ainda que estas classificações estejam identificadas neste relatório como «condicionantes de ordenamento» e que seja mencionada a necessidade de obtenção de licenças ou autorizações exigíveis em matéria de ambiente e ordenamento do território nos termos legalmente previstos [cap. III, pp. 8/10, E)], é preciso referir que esta "condicionante" merece muito pouca atenção na análise efectuada por este grupo de trabalho. A não contemplação na análise financeira da importância de salvaguarda dos valores naturais (capital natural, serviços do ecossistema), sugere uma desvalorização da importância destes recursos num cenário de desenvolvimento deste setor.

 

No Capítulo III, referente ao Enquadramento Legal e Regulamentar, enuncia-se que a regulamentação prevê que “deverá ser assegurada uma exploração sustentável dos recursos geológicos, económica, social, ambiental e territorial”. No entanto, as recomendações e propostas feitas no Resumo Executivo do Relatório, focam apenas a sustentabilidade da exploração do lítio em Portugal ao nível económico, nada recomendando nem propondo do ponto de vista da sustentabilidade social ou ambiental. O relatório faz uma análise bastante detalhada dos custos associados à produção de concentrados de minerais de lítio com base nos recursos minerais litiníferos conhecidos para o território nacional, considerando os diferentes processos, incluindo os custos dos reagentes químicos e da energia eléctrica. Esperava-se pois que tão detalhado relatório incluísse também nesta análise de viabilidade financeira os custos associados à minimização dos impactos ambientais causados, não apenas no restauro ecológico à superfície, mas também e fundamentalmente no tratamento das águas contaminadas (acidificadas), lamas e estéreis / subprodutos sem potencial de reaproveitamento. Deveria ainda ser também analisada a pegada ecológica, incluindo as emissões de gases com efeito de estufa, associada ao processo de transformação térmica, cujo custo (consumo energético devido às elevadas temperaturas) pode representar um quinto dos custos operacionais na produção de concentrados de minerais de lítio.

 

Face à escassez e elevados custos de exploração dos recursos minerais litiníferos, o relatório refere por várias ocasiões [Resumo executivo, pp. 8/12 e 10/12; Cap. IX, pp. 3/3; etc.] a importância da reciclagem de produtos em fim-de-vida, nomeadamente das baterias de iões-Li, de forma a implementar um sistema de economia circular para este metal. É ainda referida a complexidade e elevados custos desta reciclagem, nomeadamente das baterias de iões-Li [cap. VII, pp.13/16], que tornam o seu processamento em fim-de-vida economicamente inviável per-si, sendo atualmente uma atividade financiada pelo pagamento de uma ecotaxa por parte dos utilizadores finais. Para poder desenvolver o potencial deste sector, num contexto de economia circular (conforme muito bem sugerido nas recomendações e propostas do relatório [Resumo executivo, pp. 10/12]), deverá ponderar-se por isso o recurso ao "Fundo dos Recursos Geológicos" [referido no cap. III, pp. 7/10], financiado pelos encargos de exploração e que se destina a apoiar ações de conhecimento, conservação, proteção e valorização dos bens geológicos. Deverá também ser foco das unidades experimental e piloto de demonstração, propostas nestas mesmas recomendações, a optimização do processo de produção de concentrados, não apenas com vista à diminuição dos elevados custos que lhe estão associados, mas também com vista à diminuição do seu reconhecido impacto ambiental (nomeadamente relacionados com a utilização de reagentes químicos, como ácidos, neutralizantes, agentes precipitantes, para dissolução, e tratamentos térmicos envolvendo temperaturas na ordem dos 800°/elevada pegada ecológica associada ao consumo energético), argumento que não é aí apresentado.

 

Em relação à sustentabilidade social, seria ainda interessante apontar caminhos para a criação de mais valias para as populações locais e nacional. Por exemplo, apontando referências sobre os retornos para a população dos valores das concessões, estudando os valores de outros países da UE, de forma a não cair no erros dos contratos de concessão de prospeção e exploração de hidrocarbonetos em curso em Portugal, em que as contrapartidas financeiras para o Estado português atingem, no máximo, apenas 10% dos lucros. A nível da sustentabilidade social, é mencionado um mecanismo de “Responsabilidade Social as Empresas”, que pretende “garantir que parte da riqueza gerada pela exploração dos recursos seja reinvestida a nível local e regional”. No entanto, a LPN pode testemunhar por experiência própria no contacto e propostas feitas a empresas de exploração, que o uso deste mecanismo é baixo, dado o seu caráter voluntário e exigência de investimento por partes das empresas, apesar de prever benefícios fiscais. Assim, este mecanismo não “garante” que exista re-investimento junto das comunidades locais, podendo apenas incentiva-lo em certa medida.

 

Por fim, na análise SWOT no Capítulo IX, descreve-se como “Ameaça” “Legislação Ambiental desadequada à exploração e processamento de minerais de lítio”, não sendo especificado qual é a legislação desadequada à atividade nem como se revela essa desadequação. A redacção sugere que o grupo de trabalho classifica a lei de bases do ambiente como "desadequada" apenas porque esta possa não ser favorável, em toda e qualquer situação, à exploração e processamento de minerais de lítio.

 

É também mencionada nas “Ameaças” a “Contestação social desadequada e desinformada que provoque decisões políticas incoerentes e injustas”. No entanto, não é mencionado neste relatório o tipo de impactos ambientais da exploração de minerais de lítio, nem de que forma podem estes ser mitigados num projeto, por forma a informar a sociedade que, como se prevê, pode contestar de forma “desadequada”. Esta informação, que poderia recorrer a casos de estudo noutros países, com informação relevante a nível dos impactos e sua mitigação, seria muito relevante estar presente neste relatório.

 

 

Lisboa, dia 8 de julho de 2017

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