Tribunal dá razão às ONGA na Barragem do Pisão e anula a Declaração de Impacte Ambiental

 

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (TAFCB) emitiu em 17 de janeiro de 2025 a sentença do processo Pisão em que ANULOU a DIA (Declaração de Impacte Ambiental) anexa ao TUA (Título Único Ambiental), emitido em setembro de 2022, e condenou a APA - Agência Portuguesa do Ambiente a averbar no TUA a sentença de anulação.

 

As Organizações Não-Governamentais de Ambiente (ONGA) da Coligação C7 (ANP|WWF, FAPAS, GEOTA, LPN, Quercus, SPEA e ZERO) regozijam-se com a decisão do tribunal pois consideram que a construção da Barragem do Pisão colocaria em causa tanto os interesse nacionais como os interesses da União Europeia (UE), absorvendo fundos europeus num projeto que não respeita as suas estratégias e legislação, como a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030 incluída no Pacto Ecológico Europeu, a Diretiva Quadro da Água, o Regulamento do Restauro da Natureza e o Regulamento do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR). Estão em causa danos ambientais significativos e irreversíveis, sem que sejam expectáveis benefícios públicos significativos.

 

Quais as consequências desta sentença? Resumimos o essencial:

  • Após o trânsito em julgado a sentença proferida pelo TAFCB torna-se definitiva. Nenhum ato ou procedimento que esteja dependente da DIA/TUA pode avançar e deve ser anulado, por dela estar dependente e por estar em sintonia com uma DIA/TUA anulados;
  • O concurso público e adjudicações que lançaram a obra têm que ser anulados/revogados quando a sentença se tornar definitiva;
  • Sem recurso, deixa de haver DIA/TUA emitida válida, logo nenhuma construção relacionada com a obra pode ocorrer.

 

Num tempo em que se fala muito em investimentos no restauro da natureza e na premente luta contra as alterações climáticas, esta é uma vitória essencial para o país e para a salvaguarda do ambiente, solo e paisagem, porque “os impactes do AHFM do CRATO são irreversíveis e muito significativos para os valores ecológicos da área em estudo”, como refere a sentença, estando em causa o abate de quase 60 000 mil árvores protegidas, assim como a afetação de 14 habitats prioritários. Esta dimensão de danos ambientais contrasta com a irrelevância da nova barragem para o garante do abastecimento público das populações.

 

Dada a relevância da ação administrativa, o Ministério Público juntou-se à mesma invocando várias violações do regime de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), nomeadamente por não consideração suficiente dos impactes cumulativos do projeto e da relocalização da aldeia do Pisão.

 

Mais informações em anexo.

_______________________

A Coligação C7 é constituída pelas seguintes organizações:

ANP | WWF - Associação Natureza Portugal em associação com WWF | www.natureza-portugal.org

FAPAS - Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade | www.fapas.pt 

GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente | www.geota.pt

LPN - Liga para a Protecção da Natureza | www.lpn.pt

QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza | www.quercus.pt

SPEA - Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves | www.spea.pt

ZERO - Associação Sistema Terrestre Sustentável | www.zero.ong

 

 

 

Anexo - Alguma recapitulação sobre este caso

As Organizações da C7 bateram-se em tribunal contra a Barragem do Pisão, contestando o suposto interesse público da obra e salientando os graves impactes ambientais negativos referidos no EIA.

 

O EIA do empreendimento, designado oficialmente por Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato (AHFMC), e que inclui nas suas infraestruturas primárias a barragem do Pisão, refere claramente que “o projeto gerará significativos impactes negativos, quer na fase de construção, quer na fase de exploração, com afetação substancial de valores naturais, patrimoniais, ecológicos e socioeconómicos, diversos dos quais de carácter de alguma singularidade e relevância (quer conservacionista quer histórica)”.

 

Entre outros, a construção desta barragem resultará na destruição de habitats protegidos e no abate de árvores protegidas (quase de 60 mil árvores, entre povoamentos de azinheiras e sobreiros, espécies protegidas pela legislação portuguesa), na alteração e interrupção dos regimes de caudais naturais da ribeira de Seda, na conversão de áreas agrícolas de sequeiro em regadio incentivando o consumo de água onde ela já escasseia, reduzindo a biodiversidade, na artificialização dos usos do solo, na possível contaminação dos solos e das águas e na destruição da aldeia do Pisão, com a deslocalização dos seus habitantes, para benefício restrito a alguns grandes proprietários e aos agentes económicos ligados ao agronegócio.

 

Considerando a descrição do projeto e os impactes identificados no próprio Estudo de Impacte Ambiental, torna-se ainda óbvio que:

  • o interesse público do projeto é inexistente, uma vez que o principal objetivo da construção da barragem do Pisão não é o abastecimento público - considerando o cenário de decréscimo da população das regiões em causa, os dados apresentados confirmam que o volume útil da Barragem de Póvoa e Meadas é suficiente para abastecimento público; acresce que, no estudo do projeto, não foi feita uma avaliação de alternativas de abastecimento específicas para esta componente;
  • o projeto não cumpre os objetivos ambientais, estabelecidos no princípio de Não Prejudicar Significativamente (Do No Significant Harm - DNSH) do instrumento que o financia, o MRR;
  • a avaliação subjacente ao princípio de DNSH implica uma análise do projeto com a “opção zero” (manutenção da situação existente), que não resulta clara, sequer suficiente, do estudo de impacte ambiental apresentado;
  • a construção da Barragem do Pisão contraria o objetivo de transição ecológica, originando impactos muito significativos e negativos no ambiente.

 

O custo final da Barragem do Pisão e da central fotovoltaica aproximar-se-ia dos 300 milhões de euros, sendo que, para a barragem e a central hidroeléctrica do Pisão, o valor de construção é de 71,7 milhões de euros. A execução da barragem levará à concretização de um empréstimo contraído pelo Estado, de 140 milhões de euros, levando a mais esse endividamento público.

 

Urgia impedir a tomada de decisões subsequentes ao Título Único Ambiental (TUA) e à Declaração de Impacte Ambiental (DIA), e a inerente criação de expectativas, prejudiciais aos interesses privados e, ainda, muito mais, ao interesse público do Estado Português.

 

Por esses motivos, em novembro de 2022, o GEOTA, apoiado pela LPN, Quercus e ZERO, colocou uma ação administrativa para a anulabilidade ou anulação do TUA., e o próprio Ministério Público acompanhou esta posição colocando uma ação semelhante em 2023, reforçando os argumentos contra este projeto (vd. Anexo).

 

Face ao desenvolvimento do projeto, que não parou, apesar da pendência da Ação Administrativa, a 30 de julho estas ONGA colocaram uma Providência Cautelar pelo fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado, de prejuízos de difícil reparação, antes que a ação principal pudesse ser considerada procedente.

 

Apesar de toda a argumentação sobre os factos e riscos suscitados na Ação Administrativa e na Providência Cautelar, a sentença da primeira instância para a Providência Cautelar (7 outubro 2024) não considerou que se esteja numa situação de risco séria, atual e efetiva que faça perigar o efeito útil de uma eventual decisão de procedência da ação principal.

 

Discordando da sentença do Tribunal, recorrível, este coletivo de ONGA apresentaram, em 25 de outubro de 2024 um recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul, visando acautelar o efeito útil da ação administrativa principal.

 

O projeto do Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato (AHFM do Crato) foi alvo de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) em Fase de Estudo Prévio, tendo obtido, a 1 de setembro de 2022, a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável à execução da Alternativa 2 do projeto e condicionada ao cumprimento dos termos e condições referidos na DIA.

 

O projeto AHFMC foi aprovado no âmbito do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR), de acordo com o Regulamento (UE) 2021/241 do Parlamento Europeu e do Conselho de 12 de fevereiro de 2021, para financiamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), previamente à decisão em sede de Avaliação de Impacte Ambiental.

 

Para efeitos de desenvolvimento a Projeto de Execução as infraestruturas do AHFM do Crato foram divididas em três projetos de execução: Projeto de Execução das Infraestruturas Primárias; Projeto de Execução das Centrais Solares Fotovoltaicas; Projeto de Execução das Infraestruturas Secundárias, que foram também objeto de consulta pública e sobre as quais as ONGA tiveram também pronúncias negativas.

 

Deste modo, de 09 de Março a 29 de Março de 2023 decorreu a consulta pública RECAPE do Projecto de Execução do AHFM do Crato – Barragem do Pisão – Infraestruturas Primárias.

 

Em 18 de Agosto de 2023 foi publicado o Anúncio de Procedimento nº 13941/2023 – Concurso Público Internacional, cujo objecto do contrato é precisamente a Empreitada geral de Construção das infraestruturas primárias de regularização de caudais do Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato – Barragem e Central Hidroeléctrica do Pisão.

 

Em 23 de Outubro de 2023 foi publicado o Anúncio de Procedimento nº 17714/2023 – Concurso Público, cujo objecto do contrato é o Apoio ao pedido de suspensão parcial dos PDM que integram as infraestruturas do Empreendimento de Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato – Barragem do Pisão.

 

De 03 a 23 de Novembro de 2023, decorreu a consulta pública RECAPE do Projecto de Execução de Infraestruturas de Regadio do Aproveitamento Hidroagrícola do Crato, após a qual a decisão foi no sentido de ser declarada a não conformidade com a DIA.

 

Em 08 de Novembro de 2023 foi publicado o Aviso de prorrogação de prazo nº 2567/2023 que prorrogou o prazo para apresentação das propostas do concurso público indicado supra até dia 18 de Novembro de 2023.

 

Em 02 de Janeiro de 2024 foi publicado o Aviso de prorrogação de prazo nº 10/2024 que prorrogou o prazo para apresentação das propostas do concurso público internacional indicado supra até dia 21 de Maio de 2024, para construção da infraestrutura da Barragem do Pisão no valor de 71,7 milhões de euros.

 

Tendo terminado o prazo para apresentação de propostas, existem oito propostas válidas, de entre empresas e consórcios portugueses e estrangeiros, as quais irão a partir dessa data ser analisadas e objecto de decisão.

 

Em 11 de Janeiro de 2024 foi tal contrato para Apoio ao pedido de suspensão parcial dos PDM que integram as infraestruturas do Empreendimento de Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato – Barragem do Pisão adjudicado à empresa COBA – Consultores de Engenharia e Ambiente, S. A..

 

De 20 de Maio a 11 de Junho de 2024 decorreu a consulta pública RECAPE do Projecto de Execução de Infraestruturas de Regadio do Aproveitamento Hidroagrícola do Crato.

 

De 21 de Junho a 11 de Julho de 2024 decorreu a consulta pública RECAPE do Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato e Componente C – Aproveitamento Fotovoltaico.

 

A 8 de Outubro de 2024 a Comunidade Intermunicipal do Alto Alentejo (CIMAA) aprovou a adjudicação da obra para o início da construção da barragem, sem que se conheça o projeto e o Estudo de Impacto Ambiental da nova aldeia do Pisão, nem o destino da população do Pisão.

 

O projecto aqui em causa está a avançar com celeridade, existindo notoriamente um perigo de perda de efeito útil da Sentença a ser proferida do processo principal, que a providência cautelar pretende acautelar, pelo que em 30 de julho de 2024, foi colocada pelas ONGA uma Providência Cautelar, pelo fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado, de prejuízos de difícil reparação, antes que a ação principal pudesse ser considerada procedente.

 

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (TAFCB) emitiu em 17 de janeiro de 2025 a sentença do processo Pisão em que ANULOU a DIA (Declaração de Impacte Ambiental) anexa ao TUA (Título Único Ambiental), emitido em Setembro de 2022, e condenou a APA-Agência Portuguesa do Ambiente a averbar no TUA a Sentença de anulação.

Subscreva a
nossa Newsletter

Se deseja receber informação atualizada sobre a LPN, por favor insira o seu email:

© 2018 Liga para a Protecção da Natureza.

Powered by bluesoft.pt